Cinearte Palace pode fechar em 90 dias

Se nenhuma medida for tomada, dentro de 90 dias, o Cinearte Palace fechará suas portas. A possibilidade foi anunciada pelo diretor de programação do cinema, Adhemar Oliveira. Na última sexta-feira, ele viu, mais uma vez, seu projeto de isenção de 100% do ICMS - aprovado pelo Ministério da Cultura para empresas parceiras - ser recusado.

Há um ano sem contar com qualquer tipo de patrocínio, o Cinearte Palace, a partir do próximo dia 21, terá sua grade de horários diminuída, além da suspensão das atividades às segundas-feiras. Atualmente com 10 funcionários, o espaço, nesse primeiro momento, contará com apenas sete, depois cinco até março, quando se esgotará o prazo definido pela atual administração. “São medidas para alcançar o mínimo de equilíbrio financeiro nesse período”, justifica Adhemar.

O diretor de programação do Palace argumenta que o público do cinema vem diminuindo de maneira vertiginosa nos últimos dois anos. “Os produtos e o gosto dos freqüentadores mudam. Existem ondas nos cinemas de todo o país positivas e negativas. Para sobreviver a essas intempéries, é preciso parceria. O que não dá é para ficar como cavaleiro solitário, aprovando projeto com benefício fiscal e morrer na praia.”

Adhemar admite que cinema de rua está em extinção no Brasil. “Em São Paulo, atualmente, há apenas um e, no Rio, dois”, informa o diretor de programação, que também administra cinemas com formatos semelhantes nessas metrópoles. Por outro lado, ele ressalta o forte poder de revitalização dos centros urbanos. “Com o funcionamento dos cinemas, as pessoas circulam mais na região até tarde. Localizado em área nobre da cidade, o Palace contribui para a valorização do entorno, bastante prejudicado antes da reforma.”

Nas mãos da sociedade
Segundo Adhemar, compete à sociedade juizforana refletir se quer manter o Cinearte Palace. “Não estou anunciando o fechamento, mas a situação como está nos leva a isso”, diz o empresário, ressaltando que não está acostumado a encerrar as atividades em salas de projeção, mas, sim, inaugurá-las.

O empresário lembra os tempos áureos do Cinearte, quando abrigou encontros com cineastas, pré-estréias com participação de artistas e lançamentos de filmes com a primeira exibição em nível nacional. “Tivemos debates históricos com presença de nomes como João Moreira Salles e Zuenir Ventura. Na oportunidade, Salles ressaltou a beleza do espaço, que, hoje, realmente carece de reforma.”

Adhemar explica que restauração, pintura e troca de equipamentos não são os principais problemas para a administração do cinema. “Precisamos de patrocínio para bancar o dia-a-dia do espaço”, comenta, observando que, quando finalizou o contrato com o Unibanco, há três anos, o Palace deixou de contar com um importante auxílio financeiro. O administrador lembra, ainda, as ações de democratização de acesso ao cinema realizadas pelo Cinearte. “Desenvolvemos projetos como ‘Clube do professor’, ‘Escola no cinema’ e ‘Curta Petrobras às 6’”, enumera.

Projeto inicial
O Palace retomou as atividades em setembro de 1998, após 15 anos fechado. A reforma custou R$ 600 mil e dividiu o antigo cinema de estilo art déco, inaugurado em 1948, em duas salas de 225 lugares (sala 1, no térreo) e 181 (sala 2, segundo piso). A recuperação do Palace foi viabilizada por meio da parceria entre Prefeitura de Juiz de Fora, Circuito Cinearte e Distribuidora Riofilme. Parte da massa falida do Banerj, o Palace foi resgatado por meio de negociações da administração municipal da época com o governo do Rio de Janeiro, resultando no aluguel do imóvel para o Cinearte.

A diretora de cultura da Funalfa, Berenice Trogo, informa que a superintendente da instituição, Marluce Araujo, reconhece a importância cultural do espaço e tem interesse de se empenhar por sua preservação. Observa, entretanto, que os representantes da Funalfa terão que se reunir com outros órgãos para analisar a situação de maneira mais detalhada, inclusive quanto à questão legal. “O objetivo é tentar solucionar o problema de forma que não haja prejuízo cultural para a cidade.”

"Freqüentei o Palace desde os tempos majestosos do primeiro cinema, passando pelo Unibanco Palace, até hoje. Tenho uma ligação afetiva com o espaço. Os filmes dos quais participei, como “Quase nada” e “Zuzu Angel”, de Sérgio Rezende, e o curta “Calçadão”, de Franco Groia, foram lançados lá. Acho que a prefeitura precisa fazer alguma coisa, afinal, ela investiu dinheiro público na reforma"
Thadeu Santos, ator

"O Palace é a referência local do cinema brasileiro e da cinematografia da cidade. É aberto a lançamentos de filmes, além de ser ponto de encontro das pessoas que gostam de cinema. Poder público e empresas deveriam tomar frente do espaço. Qualquer iniciativa privada agregará valor importante a sua marca investindo no Palace"
Franco Groia, cineasta

"Todo cinema de rua que se fecha representa uma perda para a sociedade como um todo. Salas de exibição de filmes em shopping inibem o acesso da população de menor poder aquisitivo. A preservação desses espaços, por sua vez, garante, também, a revitalização dos entornos. Em Belo Horizonte, existem três cinemas nos moldes tradicionais mantidos pelo Unibanco, e, em breve, a capital terá um cineclube no Bairro Savassi"
Rafael Conde, cineasta de Belo Horizonte

"É uma péssima notícia. O Cinearte Palace integra um reduzido grupo de cinemas no Brasil com abertura para exibição de filmes não-comerciais. Será uma grande perda para a cidade. Há que se considerar, ainda, o seu significado histórico. É preciso que a sociedade se mobilize contra o fechamento"
José Sette, cineasta

"Acho que a Prefeitura e a população devem se posicionar e impedir que isso aconteça. O argumento de que cinemas de shopping são uma tendência e que o Palace está na contramão não me convence. Não temos que nos render às tendências"
Marcos Marinho, ator e freqüentador

"Isso já vinha acontecendo aos poucos, é uma morte anunciada. A projeção e o som nas salas do Palace estão precárias. Por outro lado, é uma pena fechar o único espaço alternativo de cinema local. O Palace é o melhor lugar para exibição do Festival Primeiro Plano, por causa do hall, onde as pessoas podem trocar idéias ao final das apresentações. Acho, entretanto, que o local deve ser resgatado de alguma forma, suprindo as lacunas deixadas pela administração atual. Na última edição do evento, quando conseguimos encher as salas tanto do Palace quanto do Alameda, pude ter certeza que existe demanda para filmes fora do circuito comercial na cidade"
Nilson Alvarenga, um dos organizadores do Festival Primeiro Plano
(Publicado no Jornal Tribuna de Minas, dia 18 de dezembro de 2007)

Comentários